segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Carta de separação

Belém, um dia qualquer que eu quero mais é esquecer.

Olá (preencha como o nome que lhe aprouver),

O motivo desta missiva é evitar um provável crime passional (o de voltar pra você, por exemplo). Bem, depois de tanto tempo e tanta coisa que eu tinha presa em minha garganta pra dizer pessoalmente, sinto que as palavras me trairiam se eu estivesse diante de você, por isso preferi este veículo impessoal.
Escrevo pra dividir com você, embora minha vontade seja de subtrair toda a atenção e fidelidade dedicadas, desejo dividir com você a vergonha que sei que você não sente, a dor que eu sei que não te alcançou, bem como meu desprezo, que a essa altura já deve estar te abrasando.
Não lamento o fato de você ter saído de minha vida, você me fez um favor, agora eu sei. Lamento você ter levado com você um pedaço do meu eu (além das milhas do meu Smiles), lamento, ter descoberto tão tarde que me regeneraria, pois teria lhe dado a atenção que você realmente merecia: nenhuma. Principalmente em todas as vezes que você fez que foi, e depois fez que voltou. Te perder uma vez foi cruel, mas pensar que a(o) tinha de volta, pra depois perdê-la(o) de novo, de novo, e de novo foi um ato de tamanha barbárie, que já era tarde quando percebi os reais estragos que você causou em meu ser.
A você eu devo a morte de meu romantismo, da minha fé no ser humano e do meu desejo de aproximação, mas também devo a você o aprendizado de uma importante lição: não me magôo mais com as pessoas, porque não consigo esperar mais nada delas. Graças a você eu não choro mais, nem de alegria, nem de tristeza, e a solidão, que antes eu tinha por inimiga, tornou-se uma parceira quase constante.
Risquei da minha vida tudo o que você deixou: as fotos de nós dois, mal tiradas por você de propósito, seu cheiro que ainda impregnava alguns lençóis de cama, a sífilis que você disse ter pego em um banheiro público, as contas de motel em meu cartão de crédito, que ironicamente não foram desfrutadas comigo e etc. melhor parar por aqui...
Quero que você saiba que a parte de mim que quer que você seja feliz achou importante que você soubesse como eu me sinto pra que você possa repensar seus caminhos; a parte de mim que quer que você se dane escolheu o que dizer na carta, e a parte de mim que não está nem aí pra você te absolve da necessidade, ou mesmo da possibilidade de você responder.

Adeus,
(não espero de verdade que você passe bem.)

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(assine seu nome)

Delírios de um náufrago - Prefestum nefastum II - um minuto antes do depois do fim.

A paradinha lá no Purgatorium Club foi muito instrutiva pra mim: enquanto eu tava por lá, conheci uma galera que tava saindo pra pinga de fim de semana, um deles, o seu Caronte, me contou que era meio que o porteiro do lugar e tal, mas que não sabia o que rolava por trás daquele lance... ele achava que era alguma transação errada, mas não reclamava não... a grana era boa, o trabalho era maneiro, de vez enquanto paquerava uma alma penada que ali chegava, sem que o chefe viesse lhe aporrinhar o saco, por isso pra ele tava valendo. Notei que ele trazia uma corrente na mão.
- Diz aí, ô Caronte, que porra é essa?
- Ah, 'so aqui é o cachorrinho que fica lá na casa do patrão... - enquanto falava, puxava a corrente, até revelar um vira-lata, sei lá, um bicho de sete cabeças.
- Bichinho feio esse aí, meu, por que que só três cabeça tão funcionando? perguntei, tentanto não ser rude (como se isso fosse realmente possivel...)
- Porque as outras quatro morreram de meningite, ou seja lá o que for. O nome dele é Cerebus, ou uma merda assim, nos tempos de glória isso aqui era "o" monstro de sete cabeças do inferno... agora, é só um pagaré velho de três cabeças. O inferno anda um inferno, sá'co'mé, né? Falando nisso, tu é novo na área, é? Cuidado co's diabrete da rua do limbo... são tudo neguinho barra-pesada.
- Falou, pode crê. Seguinte, qual o encaminhamento que o cara tem que tomar quando chega novato aqui?
- Os cara num te dero o papo quando "caiste" aqui? tu vai ter de passar por mim, velhino... qual é a tua?
- A minha? ( que porra é essa agora? ). Minha o quê, meu?
- Tua laia, tua curriola, teus pexe, teus mano, qual o pau que tu te esfregava, qual a tua religião, sacô?
- De vera verdadeira... saquei, não.
- Dexa ver se eu consigo te explicar de forma que até um vivo entenda: se tu és presbiteriano, vou te levar pra onde tu estiver predestinado, se tu fores adventista, testemunha do Jeová, budista, espírita ou coisa assim, tu vai ser levado pra tomar uns corretivo, e, com sorte, tu até pode reencarná... agora se tu for protestante, muçulmano, cristão de uma forma geral ou qualquer um desses lances, assim, mais extremistas, cara, aí eu vou te conduzir pra acomodações permanentes do recinto...
- E como que é lá?
- Te falei que meu lance só é levar a galera até lá...
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Bicho pegou...! Me lasquei bonito agora! Tava tão ocupado vivendo, que nem me liguei nesses lance de religião... agora fudeu-se! Sou um ateu de mão atadas!

to be continued...