sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Delírios de um náufrago - Pré-festum

Minha lembrança mais antiga é por demais antiga... os desgraçados começam a viver mais cedo, afinal. Como eu era um deles, não é de se admirar que lembro de coisas tão velhas e tão amargas.
A infância (que é infância?) foi, digamos, pitoresca. Levando em consideração que essas barbadas, tipo ECA (é eca mesmo!), não existia, então não dava pra correr solto como essas molecada de hoje. Então seu moço, dá pra sacar que eu levei muita porrada antes de aparecer a primeira penugem na cara. Mas, sem essa, não vou contar todas quebradas dessa história, se é só pra constar, vamos na versão rápida. Me lembro de um lance, de quando eu já era mais taludo (em vários sentidos, diga-se). Foi uma época de descobertas...
A primeira coisa que eu descobri foi o poder dos nomes:
"Se Cáçia Quis o Peni's Lene
i si Bete Faria o que ela fez,
Me pregunto o que Reginaldo Farias,
ao descobri o pau da Verônica...
ia sê mais um Ronadinho?
ou teria dado, qui nem o Dolabela,
di ombro?"
Juro que li essa infâmia no banheiro das meninas da escola indígena da tribo dos akidauanus numa dessas viagens que fiz pra defender um trocado de michê.
Porra, só que nem tudo é festa. veio a idade, a gonorréia, a falta de coragem e principalmente a barriga... minha carreira de michê michô, eu fiquei na merda, literal mente pensando o que fazer com meu cu na mão... (embora eu tenha até considerado a idéia de pular de prostituto a prostituta, achei que isso seria descer demais (seria descer até o talo!), por essas e outras apaguei essa idéia de infeliz da cabeça). Fui mendigar então. Me admirei da bondade das pessoas: quando pedia um completo de um real, levava um sonoro NÃO! no meio da cara, mas quando pedia uma dose de cinco estrelas de um e cinquenta (copo passando da boca de tão cheio) ganhava até duas... sei não, mas acho que a sociedade queria me fuder a cartola de qualquer maneira..., (mas quer saber? deu certo não bando de cuzão!!!).
Meu mergulho social ia de vento em popa (de menor problema a mendigo(= problema nenhum)), até que um dia, de repente, não mais que de repente, eu vi uma oportunidade... ela tinha os cabelos vagabundamente pintados de blondor, uma barriga mais indecente que a minha e tava cheia de sangue saindo de um barquinho na beira do cais (= o jardim de casa).
Primeiro eu agradeci aos céus que aquele pesadelo ambulante (como alguém ainda paga pra comer aquilo?) foi embora, depois desci pra olhar do que era aquela groselha que adornava a indumentária da donzela. Meu, tá certo que "de graça é mais gostoso", "um centavo é melhor que porra nenhuma no bolso", "na guerra urubu é frango", mas eu acho que nem o barqueiro aguentou aquele tranco. parece que quando o cara quis pular fora, a madame puxou pro acerto... na ponta da peixeira.
Tava lá eu, o barco e a carcaça do cara... era me mandar ou me mandar de barco... não vou dizer o que eu escolhi. Só vou te contar que aquela foi a primeira vez que eu pisava num barco... e a última também...
Ô minha nega, serve mais desse mijo aí pra lavar a porra do peritônio, serve um outro também aqui pro seu capeta...(hic!), esse teu rabo pontudo é um arraso, meu bem! (arrôto!)

Ps: Esse conta quem e o quê era o náufrago antes de sê-lo. Se há um pre-festum, logo haverá um post-festum. Não deixe de acompanhar a saga do náufrago.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Delírios de um náufrago II

Sonhei que navegava num sem-fim de prazeres,

Um mar de lascívia, destes, imaginava eu, nunca dantes navegados

De águas entorpecentes, coberto de pererecas de todas cores, raças e sabores,

Onde nada mais se enxergava, senão o azul do céu, e as pererecas deste mar

Formando um contraste penetrante no horizonte.

Vi os peixes com seus formatos fálicos saltando uma altura inimaginável,

Para vigorosamente mergulhar.

Não bastasse a visão de tamanhas belezas,

Ouvi o canto de sereias sussurrando promessas de uma esbórnia sem igual.

“Lança-te neste mar regala-te em teus desejos,

Aqui não há lei, aqui não há limite,

Seremos tuas, vem nos possuir”

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Nessa hora o mar se agitou, de pequenas ondas formou enormes vagalhões de sensações

Calores que eu nunca havia sentido, seguidos de súbitos calafrios,

Me conduziram da vida para a morte, e depois de novo à vida

Para novamente voltar a morrer,

Queria fechar os olhos para me perder naquela atmosfera libertina,

Mas os queria ao mesmo tempo abertos para desfrutar da visão

De tantas delícias saradinhas em avidez sensual.

Naquela hora decidi não mais acordar,

Atirei-me no mar de pererecas, e , ali eu morri,

Em meio a prazeres nunca dantes desfrutados.

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Ao nascer o novo dia, jazia um corpo em uma praia esquecida,

Morto em prazeres.

Era tanto mar naquele dia, que aquela carcaça não suportou tamanha arrebentação

Das tais águas inebriantes, cobertas de pererecas de todas as cores, raças e sabores.

Delírios de um náufrago I

Um dia luz, outro escuridão.

Um dia festa, outro desolação.

Um dia o luxo, outro, nada mais que abandono

dancei, comi, bebi, amei...

agora, solidão.

Queria ser livre, ganhei imensidão.

Queria ter tudo, ganhei mais do que podia me tornar,

Tornei-me imperador, Senhor em alto mar,

Senhor de apenas um súdito.

Eu que adorava comer pescado,

Vejo os peixes a me rodear,

Morrendo de sede, em meio a este mar inútil.

Não sei que dia foi ontem,

Imagino que o dia de hoje será o que irei morrer.

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Quando a escuridão me abraça, não consigo discernir se é a noite

Ou a escuridão que me abraça

Deixo-me levar pelas fadas negras,

Anjos de escuridão...